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Ciclo de debates na UFBA começa com reflexão sobre o caráter da atual crise

“É possível assegurar condições de vida dignas a todos

A primeira parte do ciclo de debates “Desenvolvimento, Sociedade e Intervenções Governamentais”, promovido pela UFBA, trouxe a proposta de uma reflexão sobre as condições concretas da sociedade brasileira. Com a participação dos professores Ladislau Dowbor, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e Carlos Brandão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o evento aconteceu na manhã da sexta-feira, 11, no Pavilhão de Aulas Glauber Rocha – Paf III, no campus de Ondina.

Ladislau Dowbor criticou a grande concentração de renda, que é uma realidade: “1% da população mundial tem patrimônio superior a 99% do restante das pessoas”, disse. Em sua avaliação, com o que se produz de riqueza no mundo atualmente e com os recursos tecnológicos disponíveis, seria possível assegurar condições de vida dignas para todos. “A produção alimentar contrasta com as milhões de pessoas que enfrentam a fome no mundo”.

“Estamos destruindo o planeta em benefício de uma minoria”, ressaltou o professor para lembrar dos efeitos do aquecimento global pela ação do homem e da destruição da natureza. Foram apontadas outras questões sociais daí decorrentes, como a dificuldade de acesso à agua por populações mais vulneráveis, em razão do comprometimento dos mananciais de água doce e da derrubada das florestas.

“O planeta não suporta esse nível de atividade humana. Para seguir o padrão de consumo norte-americano, serão necessários mais quatro planetas”, alertou Dowbor, que faz também uma crítica à capacidade de organização da sociedade e constata a “erosão planetária da governança”, com a perda de confiança nas instituições, no congresso, no judiciário, na mídia. “Enfrentamos uma crise civilizatória e precisamos repensar o mundo”.

O professor falou sobre a “financeirização” que passa a controlar o sistema produtivo, quando aplicações financeiras valem mais do que investimentos. “Nesse caso, não há investimentos, há uma expropriação”. Ele ressaltou que os principais bancos do mundo concentram recursos que superam o Produto Interno Bruto (PIB) de um país como o Brasil.

Conforme explicou, a demanda das famílias é o principal motor da economia, o que gera atividade empresarial e empregos. O dinheiro gerado a partir dessa demanda, também gera impostos que vão para o governo e devem se transformar em investimento social. “É preciso recuperar esse ciclo”, sugere Dowbor, que se diz contrário ao conceito de austeridade defendido por muitos nos tempos atuais. “Austeridade é um arrocho que faz o dinheiro ir parar na mão de poucos”.

Ele avalia que o consumo das famílias está travado devido a um endividamento da população que paga “juros de agiotagem”. Segundo o seu entendimento, não se vai sair desse buraco dando mais dinheiro para os ricos, que deixarão seu dinheiro guardado em papéis. “E, se abaixarem os juros dirão: É o déficit”, finalizou.

Carlos Brandão reafirmou a importância central dos movimentos sociais de discussão da dívida pública

Carlos Brandão, a importância central dos movimentos sociais

Carlos Brandão enfatizou a importância de discutir esses assuntos no grave momento político nacional,  tempo também de muitas transformações sociais, econômicas, ambientais e culturais. Apontou  as iniciativas de reforma trabalhista e da previdência como exemplo de ações de um capitalismo rentista e patrimonialista, marcado pela intervenção do Estado em favor do capital.

O professor da UFRJ reafirmou a importância central dos movimentos sociais de discussão da dívida pública.  “Não existe o déficit da previdência alardeado pela mídia brasileira”, disse ele, que sugere mais pesquisas e um maior entendimento acerca do mundo privado, dos grandes conglomerados, da administração pública e da circulação de capitais no sistema. “Se queremos criar um poder contra-hegemônico, é preciso entender o encadeamento das decisões do poder”. Então, essa seria uma forma de construir uma nação interrompida por decisões pouco democráticas e submetidas ao jogo financeiro.

O vice-reitor da UFBA Paulo César Miguez, que participou da mesa de abertura do encontro, lembrou que o ciclo de debates é um evento preparatório para o Congresso de Pesquisa, Ensino e Extensão, no próximo mês de outubro. “A Universidade certamente dará novas e boas contribuições como espaço de reflexão e críticas”, afirmou.

O primeiro dia do Ciclo, com a moderação do professor Elinaldo Leal Santos, da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), continuou à tarde, com os professores Genauto Carvalho de França Filho, do Núcleo de Pós-Graduação em Administração (NPGA/UFBA), e Gabriel Kraychete, da Universidade Católica do Salvador (UCSAL).

O Ciclo de debates terá sequência na segunda-feira,  14, com a conferência do economista e cientista político Luiz Carlos Bresser-Pereira, com o tema “A Reconstrução de um Projeto Democrático e Nacional para o Brasil”, a partir das 9 horas, no Salão Nobre da Reitoria.

O tema “Interpretações da sociedade brasileira” será abordado na parte final do evento, no dia 24 de agosto, com a presença do antropólogo Antônio Risério e do professor Carlos Sávio Teixeira, da Universidade Federal Fluminense (UFF), no Pavilhão de Aulas Glauber Rocha – Paf III – campus de Ondina. Participarão também os professores da UFBA José de Souza Crisóstomo e Pedro Lino de Carvalho, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) na Bahia.