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Peças de gesso restauradas são tema de exposição em comemoração aos 140 anos da EBA

Mostra fica aberta até quarta, 31

(Foto de capa: núcleo de restauração e conservação da Escola de Belas Artes)

 
Peças restauradas da coleção de gesso da Escola de Belas Artes (EBA) da UFBA podem ser apreciadas na exposição “Saberes e Fazeres da EBA”, na galeria Cañizares, no bairro do Canela, até quarta-feira, 31 de dezembro. A mostra – que faz parte das comemorações dos 140 anos da EBA e tem entrada gratuita – revisita a história da Escola desde sua fundação em 17 de dezembro de 1877, ainda como Academia de Belas Artes da Bahia.
 
“São peças que fazem parte da Academia desde seu início. Elas chegaram um ano após a inauguração, mas foram solicitadas ainda no momento de fundação”, conta a restauradora Rosana Baltieri, da EBA. As peças de gesso datam do século XIX, a maioria, explica ela, são do Museu do Louvre em Paris, França, “quando ainda era permitido fazer cópias das obras”.
 
O Solar Jonathas Abbott, na rua 28 de Setembro, paralela a ladeira da praça, foi a primeira residência das réplicas de gesso. O local abrigou a Academia de Belas Artes da Bahia, que, com a reforma do ensino médio e superior da República – a reforma Benjamim Constant em 1895 – foi renomeada de Escola de Belas Artes da Bahia. Em 1947, um ano após a criação da UFBA, Belas Artes, segunda escola superior da Bahia e segunda escola de artes do Brasil, vinculou-se à universidade idealizada por Edgar Santos.
 
Além de ocupar um lugar de destaque no Solar Jonathas Abbott, as peças eram utilizadas como objeto de estudo plástico, função que se manteve até 1969, “quando foi abolido o gesso nas salas de aula, dando lugar à arte moderna contemporânea”, diz Nanci Novais, diretora da Escola e curadora da exposição. Segundo ela, “achou-se que era tempo de os alunos trabalharem com o modelo real, modelo vivo, natureza, objeto geométricos”. Começara uma nova fase do ensino da escola voltada à realidade.
 
Um ano depois, a EBA mudou-se para a atual sede, antes ocupada pelo Instituto de Geociências, na rua Araújo Pinho, no Canela. Ao longo dos anos, o prédio passou por reformas importantes, como a construção dos pavilhões Mendonça Filho e Germano Tabacoff, a recuperação do solar principal e da Galeria Cañizares. Hoje, a Escola oferece quatro cursos de graduação: artes plásticas, licenciatura em desenho e plástica, design e decoração.
 
Nanci Novais acredita que o transporte inadequado das peças de gesso do Solar Jonathas Abbott até o palácio da Reitoria, onde a coleção ficou abrigada por anos, foi um dos fatores que levaram a deterioração das obras – algumas peças também foram para o Museu de Arte Sacra da Bahia. “O acervo diminuiu de 300 para cerca de 250. Sem conhecer o devido valor, as pessoas manipulavam as peças sem cuidado durante a mudança. Muitas peças caíram e quebraram. Terminaram chegando mais pedaços do que obras inteiras nos porões da reitoria”, diz Nanci Novais. As réplicas também ficaram armazenadas em local com goteiras. Segundo a diretora, “as obras, inclusive, têm marcas de água que corroeram o gesso”.
 
Retiradas dos porões do palácio da Reitoria, as peças permaneceram guardadas na Escola de Belas Artes por cerca de 20 anos. Em 2006, iniciou-se um projeto de revitalização, efetivado somente em 2014. Desde então, o núcleo de restauração e conservação da Escola – que já restaurou cerca 70 telas, entre elas, Nu Masculino Sentado II de Archimedes José da Silva de 1900 – estudou e recuperou mais de 25 peças de gesso, num trabalho que envolve pesquisa antes da intervenção direta.
 
Os serviços de restauração são chefiados pelo professor Tulio Almeida, que também leciona na disciplina conservação e restauração de obra de arte. Ele conta que o acervo da Escola é utilizado como material didático, “o aluno aprende a fazer diagnóstico e uma proposta de restauração”. Apesar de o estudante não intervir diretamente, assegura o professor, o aluno estuda as obras danificadas, pesquisa e propõe ações.
 
Exemplo de atuação do núcleo, Rosana Baltieri fala sobre as intervenções na réplica Lourenço de Médici, de Michelangelo. “A reconstituição no capacete foi necessária porque a peça tinha lacunas que serviriam como depósitos de sujeira e insetos. Optamos por uma intervenção somente volumétrica, sem detalhar a peça de modo semelhante ao original, o que torna evidente a manipulação”, relata. Para ajudar o apreciador no escrutínio das transformações das obras, duas fotos ampliadas na parede da galeria mostram as obras de gesso originalmente conservadas, ainda em tempos de Solar Jonathas Abbott.
 
“Adotamos um critério diferenciado de intervenção nessas peças porque, no Brasil, principalmente em Salvador, estamos acostumados a encontrar peças muito antigas em perfeito estado, como se nada tivesse ocorrido com as obras. Isso elimina os danos que a peça sofreu e nós [o núcleo] acreditamos que ela deve ser trabalhada para que tenha uma dignidade ao ser exposta, para que o observador consiga olhar e interpretar a peça, mas sem ocultar os danos que ela sofreu no passado”, diz Rosana Baltieri.
 
A exposição também abriga peças não restauradas, com todos os danos sofridos ao longo do tempo. “Trouxemos pra mostrar como pegamos essas peças, como elas se encontram atualmente”, conta Rosana Baltieri. A mediação nas réplicas de gesso também faz parte da mostra. O público pode apreciar o trabalho da equipe de restauração, que realiza limpeza, consolidação, recomposição e, quando necessário, retoque nas obras de gesso.
 
“É função da arte revelar novamente esse tempo que acaba desaparecendo, a história é feita desses encontros e reencontros com o passado”, observa Ricardo Bezerra, um dos dois coordenadores da Galeria Cañizares. O acervo de clássicos gregos, na visão de Bezerra, acrescenta à escola porque enfatiza seu papel na difusão cultural da arte. Na verdade, desde 1990, há um movimento na Europa de valorização dessas peças, justamente pelo valor histórico de modelo para o exercício, seja da pintura, do desenho, da modelagem, narra Rosana Baltieri.
 
O acervo da Escola de Belas Artes, além das obras em gesso, é composto por pinturas de cavalete, em tela ou madeirite, num total de 200 peças, 137 obras em papel com técnicas diversas, 43 fotografias ou infogravuras, 12 peças em bronze, 15 esculturas e 04 entalhes, num total registado de 657 obras de diferentes períodos históricos. “Esse número é maior, pois é necessário catalogar outras peças”, informa a restauradora Rosana Baltieri.